quinta-feira, 11 de julho de 2013

LICANTROPIA: O CONFLITO ENTRE A RAZÃO E A EMOÇÃO NA CONDENÁVEL VIDA DE GRISWOLD

O lançamento de uma Historia em Quadrinhos é sempre um evento maravilhoso, em que a obra criada e os seus criadores compartilham em cumplicidade com amigos e apreciadores da nona arte de seu nascimento. Parece ser um filho que damos a luz e nos vem reunir os amigos e admiradores a seu redor. Assim o foi com a HQ " A Condenável Vida de Griswold" da qual fiz o prefácio. Nesse momento, penso que novamente a Kótica acertou a mão nesse novo empreendimento. E como não acertaria, com o texto poético e visceral do grande escritor Marcos Guerra, além da arte do Paulo Silva que nos faz sentir um frio na espinha, assim como nos evoca o medo, resgatado das entranhas de nosso subconsciente que achávamos que não havia como algo provocar esse sentimento.

De fato, a Historia parte de um pressuposto brilhante e instigante, a saber, de que o dito Griswold  Übel realmente existiu e foi julgado, admitindo no julgamento sofrer de licantropia e de ter sido realmente o assassino de jovens e crianças do seu vilarejo. A época desse julgamento se situa lá no século XVI e foi  talvez o único documento registrado que menciona alguém  sofrer desse mau. Se considerarmos ao longo da historia humana que a lenda do lobisomem é tão persistente a nossa memória quanto a do vampirismo, logo notaremos que esta se torna fonte de inspiração para tantas mídias e meios de comunicação como, por exemplo, o folclore, a literatura, cinema, rádio, poesia e demais artes.

Se considerarmos o cinema e a literatura, sem levar em consideração as diversas teses e livros de folclore e antropologia que fazem uma reflexão sobre a licantropia, que não são ligados ao entretenimento e ficção da lenda, o que constatamos é sua perversão e por que não dizer degeneração para a violência gratuita e sem sentido. O que vale é o mostrar a violência pela mera violência, contribuindo assim para uma estética da violência sem o vinculo proeminente da reflexão sobre sua natureza selvagem que põe o homem lado a lado com o seu lado negro e cruel, por que não dizer irracional? Nesse sentido, perde-se o foco da lenda sobre o lobisomem e nada de novo podemos encontrar sobre a lenda. O que nos leva a perder a razão em um momento de furia. O que nós faz adorar um belo jantar que em aparência é horrível, mas o olfato nos leva a imaginar que é delicioso.  Por que minto e sinto vontade de arrasar com alguém que não me fez nenhum mau aparentemente? As dúvidas são muitas, mas uma rápida analise da lenda em livros sérios nos leva a observar que o homem não esta assim tão distante da fera quanto os séculos de estudo nos fez e faz imaginar.

Nesse sentido, "A Condenável Vida de Griswold" é uma obra que deve ser considerada da mais extrema
relevância e mais ainda, digna de ser lida, devido o texto seguir uma graciosa métrica entre poesia e relato imagético que são bem equacionado no percurso da historia. Além disso, devemos destacar que apesar de ser uma ficção, possui uma pesquisa bastante aprofundada sobre o caso, mas que teve que ser criada vários subtramas com vista a dá um contexto ao julgamento já que o relato do dito documento sobre o caso esta restrito a penas aos  recônditos de seu julgamento. Esse é o desafio do grande escritor Marcos Guerra, criar uma atmosfera compreensível entre o julgamento que é o final do processo e as ações do personagem que o levaram a cometer o crime. Também existe dentro da historia da "Condenável" uma disputa não implícita ou será que não entre o catolicismo romano e os protestantes, algo já existente no império germânico que o dividia imensamente tanto sobre a égide da religião quanto sobre o âmbito da política. O texto de Guerra, na CONDENÁVEL,  igualmente me faz pensar que o personagem possui acessos a delírios esquizofrênicos que ora o faz escutar vozes de um lado vindas de um cordeiro e de outra vinda de uma voz onipresente e obsessiva. Realmente, o texto da "Condenável Vida de Griswold" vai ao longo das páginas revelando uma trama nada convencional que destoa da maioria das historias de comics e até mesmo de literatura convencional que podemos imaginar. Nesse ponto, demos parabéns ao ilustre escritor.

Outro ponto positivo é a arte fantástica em muitos momentos de Paulo Sergio que dá movimento e credito a narrativa gráfica da historia e compõe equilibradamente com o texto do Marcos Guerra uma magnifica narrativa. Seus tons de cinza assim como a bruma que permeia toda a historia parece sempre levar o leitor a tentar encontrar a narrativa, alguns leitores podem até ter dificuldade na leitura e na compreensão gráfica da historia, principalmente creio por que a impressão não ajudou muito, mas isso antes de atrapalhar, funciona maravilhosamente bem na narrativa por que faz o leitor prestar redobrada atenção na narração e desperta seu interessa na tentativa de descobrir o que esta se passando entre as brumas. Isso o faz também viajar dentro do subconsciente de Griswold além de ver a partir de sua perspectiva a linha de acontecimento que se desenrola na historia. Desse modo aquilo que poderia depor contra a narração se mostra, ao contrário, um estimulo a leitura tanto do texto como da narração gráfica. Por conseguinte, a arte de Paulo Sergio contribui e muito para a narração da Condenável e sua composição narrativa mostra que é possível contar boas historias sem cair na armadilha dos clichês e etc. Nesse sentido, creio que Marcos Guerra e Paulo Sergio conseguiram contar uma bela historia que mistura o tom sombrio e soturno em uma ode a inteligência. Parabéns a seus idealizadores e a toda a equipe da Kótica.



Postado por Renato Medeiros

Comentários
0 Comentários

0 comentários:

Postar um comentário