sábado, 25 de janeiro de 2014

Hibiscus



Que saudades profundas do vermelho vivo das flores no quintal da casa de vovô.
Onde brincava... usando calangos como bonecas e retalhos apanhados no quarto de costuras de vovó para vesti-los decentemente. Que saudade dos "alguens" que eu não me tornei e de tantos outros que ensaiei tanto "ser" nas brincadeiras, para errar-na-hora-certa. Que saudade dos meus irmãos, dos meus amigos, meus primos, dos meus pais, dos meus avós, e principalmente da pilha de mamonas que vovô deixava secar ao sol, no terreno da casa vizinha. E serviam de munição nas batalhas mais fantásticas. Sinto uma saudade estranha de quando as pessoas estavam do meu lado não porque precisavam ou porque precisava delas, mas porque estar lá era o lugar delas. Simples assim. Sinto saudades do meu pai me dirigindo nas fotografias e da decepção que era ver a meia dúzia de retratos revelados do filme de 24 poses. Se tenho saudades pra oferecer... foi porque as cultivei debaixo daquele pé-de-hibiscos, inventando histórias com calangos. Tai, só não sinto saudades de inventar histórias, essa saudade eu não tenho. Talvez porque tal "mania" nunca me abandonou. Nunca. Hoje, todas as noites antes de dormir, tomo uma caneca das flores vermelhas que vovô tinha no quintal (não as mesmas flores, o pé já não existe mais, assim como meu avô, meu pai, as viagens pro interior e a pureza nos meus olhos). Imagino como seria minha vida se soubesse naquela época que aquelas flores poderiam servir pra fazer chá (na garrafa de chá sobre a mesa sempre tinha cidreira). Quando criança tinha a certeza que flores só serviam pra enfeitar, e ponto! Igrejas que eram assustadoras por causa dos bonecos de olhos pesarosos e caixões para os mortos que passavam rumo ao cemitério em procissão (saudades de ter certeza). Ah, as flores serviam também pra enfeitar os cabelos das moças bronzeadas nos comerciais da kolynos. Mesmo achando muito estranho as flores nunca caírem, eu admirava.
E sinto saudades. Não sei explicar bem, mas aceito que isso deve ser vida de gente grande: Um monte de flores secas num saquinho pendurado por um barbante, boiando numa caneca grande de água fervente.

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